Month: May 2010
Buenos Aires bye bye (15)
Confesso aqui que não sou particular fã de futebol. Não sou. Gosto de acompanhar os jogos da selecção e, obviamente, fiquei muito contente com a vitória do nosso Benfica no campeonato nacional. E por aí fica o meu entusiasmo futebolístico.
Agora, convenhamos, não há melhor disparador de conversa que a simples menção de um clube de futebol, seja ele qual for. Explico: se há coisa de que gosto (e desconfio que herdei isso do meu pai) é de uma bela converseta com taxistas. Não há nada antropologicamente mais divertido que isso, tenho para mim, apesar de conhecer muita gente que não imagina tortura pior que a de ter de ir a falar enquanto não chega ao destino. Eu gosto, e muito.
Da próxima vez que entrarem num táxi proponho que olhem para o galhardete pendurado no retrovisor. E depois experimentem dizer o nome do clube.
(Num parêntesis, aproveito para revelar as minhas estratégias. Recorro principalmente a duas variantes: “então e o nosso Benfica, hã?” e a “como é que ficou o jogo do Boca?”. Quem diz Boca, diz Sporting, Porto, Belenenses, Independientes ou River. Não importa. Fecho parêntesis e sigo para bingo.)
E assim, estratégia infalível, têm conversa garantida até ao final da viagem.
Buenos Aires bye bye (14)
Cidade de cultura, em Buenos Aires há sempre qualquer coisa a acontecer: entre teatros, cinemas, museus, galerias de arte, centros culturais e espectáculos de rua, não há dia que passe sem actividades. A dificuldade, de facto, está na escolha.
Por isso, um dos nossos passatempos favoritos de fim-de-semana era ir ver o que havia lá perto de casa. Íamos ao Centro Cultural da Recoleta ou ao Museu de Belas Artes, ao Palais de Glace ou a alguma galeria, e havia sempre, mas sempre, qualquer coisa interessante para ver.
Uma das modalidades que a mim mais me impressionou foi a dos espectáculos de rua “a la gorra”, ou seja, em que no final da apresentação é passado um chapéu para que as pessoas depositem a contribuição que entendam corresponder à qualidade do espectáculo. E não é que as pessoas colaboram, ainda por cima sem avareza?
Buenos Aires bye bye (13)
Novembro é o mês dos jacarandás em flor. É também o meu mês preferido para estar em Buenos Aires: não só há uma histérica nuvem lilás por toda a cidade, há também um ambiente de alegria pela chegada do bom tempo, do fim do ano, da proximidade das festas a marcarem o início do Verão e das férias.
É verdade que as ruas ficam um bocadinho pegajosas com as flores que caem, mas tudo vale a pena só para termos aquele espectáculo durante um par de semanas.
Buenos Aires bye bye (12)
Algumas esquinas de Buenos Aires emanam uma aura de charme decadente. Talvez seja pela grandiloquência desta arquitectura estilo parisiense, aparentemente fora de lugar, mas tão bonita, neste ponto da América Latina. Esta é uma cidade cheia de encantos, e os edifícios que resistiram à construção dos arranha-céus são disso testemunho.
O centro, contudo, está degradado. Seja pela poluição que aí se faz sentir, seja porque agora já não é o lugar da moda para se ver e ser visto, na Calle Florida há um certo charme decadente no ar. Os antigos armazéns Harrod´s, hoje vazios, são disso exemplo.
Buenos Aires bye bye (11)
Um dos meus espaços predilectos em Buenos Aires, a flor é… a flor. É uma flor de metal, artificial, portanto, que mimetiza a natureza ao abrir e fechar conforme a intensidade da luz: à noite fecha-se, durante o dia está aberta. Curiosamente é também um pouso habitual para aves, o que faz com que quase todas as fotografias que tirei tenham um passarinho empoleirado numa das pétalas.
Mesmo ao lado passa uma avenida muito circulada, a Figueiroa Alcorta. Mas neste parque não se sente nada do movimento louco da estrada: há calma, espaço, verde, alguma sombra e a imponência da flor no seu espelho de água. Quando me treinei para correr os 10km, frequentava muito este jardim porque podia fazer um caminho bonito com algumas subidas e descidas, com uma gravilha macia ao impacto de cada passo e, sobretudo, sem cheiro a cocó de cão. Na Primavera, levávamos uma mantinha e o jornal do dia e íamos para lá apanhar um bocadinho de sol. Enfim, a flor é um espaço de muitas e boas memórias porteñas e continua a ser a imagem de fundo do meu computador. Vou ter saudades!
Buenos Aires bye bye (10)
Nestes anos argentinos também me despedi dos meus óculos (viva o laser!) e, de caminho, despedi-me também da melena comprida.
Curiosamente, na Argentina é muito difícil cortar o cabelo, porque argentina que é argentina usa-o longo e muuuuuito liso, perdendo diariamente horas com todos os preparativos. Ele é lavar, ele é banho de creme, ele é secar e alisar… Claramente não estava preparada para isso. Nem estou.
Chegando ao cabeleireiro, pedia que me cortassem o cabelo, sem medo, mas regra geral não tinha grande êxito. A pressão cultural é tão grande que ninguém se sentia à vontade para o fazer. Até que descobri o “meu” Walter, que logo na primeira visita desatou a desbastar-me a juba com tanto entusiasmo que até o filmei e tudo.
A partir daí, foi sempre a abrir, ou a encurtar o cabelo, e hoje demoro o total de cinco minutos completos entre lavagem, penteado e secagem. E para o calor, nem vos conto, dá cá um jeitaço.
Buenos Aires bye bye?
Podia ser um post da série “Buenos Aires bye bye”, mas não é.
Na semana passada, a nossa última na Argentina, ficámos instalados num hotel de executivos, bem no centro. É um hotel de uma cadeia internacional, onde maioritariamente se instalam homens de negócios, tripulações de cabina em trânsito pela cidade, enfim, estão a ver o género. Não é propriamente o vão de escada ali do prédio dos fundos.
Ora precisamente neste hotel, fui interceptada duas vezes pelos seguranças para saber se era “acompanhante”.
Acontece que o Sheraton Retiro, pelos vistos, é frequentemente visitado por profissionais desta área de negócio, também conhecidas como prostitutas de luxo. E aparentemente – uma pessoa está sempre a aprender – os seguranças cobram uma comissão nas tarifas das ditas profissionais para as deixarem subir aos quartos dos ditos executivos. E quem era eu para entrar por ali adentro sem pagar o que lhes era devido?
No final da estadia fui fazer a devida reclamação na recepção. Preambulei avisando que era um assunto delicado, mas nem mesmo assim consegui evitar que a recepcionista emudecesse de vergonha, acompanhado do inevitável rubor facial. “Representando el hotel, pero sobre todo como mujer, le pido mil disculpas. Hablaré con los chicos de seguridad.”
E esta, hein?
Buenos Aires bye bye (9)
Uma das (minhas) descobertas porteñas foi a pintura. Comecei a frequentar as aulas de pintura da Asociación de Amigos del Museo de Bellas Artes, com modelo vivo, e a minha vida foi mudando, aos poucos.
Penso que a minha profissão, a de designer de comunicação, é muito desgastante em termos criativos. A páginas tantas, no meio do turbilhão dos trabalhos, há pouco tempo para testar, experimentar novas soluções para resolver os problemas (de comunicação) propostos pelos clientes. E isso acaba por, paulatinamente, opacificar a nossa estrelinha brilhante, aquela a que podemos chamar de criatividade.
A pintura, portanto, apareceu-me como um terreno de teste, onde tudo, mas tudo mesmo era permitido. Em cada exercício que fiz predispus-me para o erro, para o teste, para tentar uma coisa diferente – tudo experiências que no trabalho como designer, a maior parte das vezes, não tenho tempo para fazer.
O tricot e as lãs também foram, curiosamente, uma forma de teste criativo e, paralelamente, de integração na cidade. Através do ravelry, comunidade tricotadeira virtual (e mundial), encontrei pessoas muito diferentes com uma coisa em comum: o gosto pelo tilintar das agulhas.
Uma coisa levou a outra e hoje tenho uma marca de roupa para pequenitos tricotada à mão, a abbrigate*. Como a necessidade aguça o engenho, um dia destes tive de arregaçar mangas e tingir lãs. Com a ajuda de um catálogo escolhi cores e fios e fui comprar as anilinas, só que, quando cheguei a casa e deitei mãos à obra, descobri que também nas lãs havia repetido o meu universo cromático da pintura, fugindo um pouco das cores que inicialmente tinha previsto obter!
Parece-me que a conclusão a retirar é que não podemos mesmo fugir à nossa natureza.
Nota: quem tiver vontade de ver o que andei a pintar durante estes dois anos, clique aqui e comente abaixo!
Buenos Aires bye bye (8): Feliz Bicentenário!
No dia 25 de Maio de 2010, este jovem país que é a Argentina celebra 200 anos de existência independente da coroa espanhola. A todos os argentinos eu desejo um feliz dia de aniversário da sua pátria: não é todos os dias que um país completa dois séculos de existência. Desejo-lhes que todos os sonhos argentinos se cumpram e que o país se transforme na casa sonhada de tantas gerações de locais e de imigrantes.
Buenos Aires bye bye (7)
Uma das boas descobertas argentinas (descoberta para mim, claro, para os outros já não era novidade) foi o trabalho de artista Liniers. A primeira coisa que vi dele foram umas páginas com reproduções do seu diário de viagem (que mais tarde se transformariam em livro) e de aí em diante foi um caminho só de ida. Gosto muito da sua técnica, mas o que realmente me chama é o humor tipo “nuvem cor-de-rosa”: um humor positivo, que não rebaixa ninguém. Parte de episódios quotidianos, coisas aparentemente sem importância e que, através da caneta dele, se revelam situações hilariantes em que todos nos reconhecemos.
Um dia, Liniers começou a pintar nos concertos de Kevin Johansen e os The Nada e eu lá fui. Descobri uma banda sonora com o mesmo tipo de humor e fiquei fã.
Na fotografia, uma exposição de vinhetas do Liniers, sobre oceanos e ecologia, na cidade de Puerto Madryn, onde fomos em Outubro passado para ver baleias.
Buenos Aires bye bye (5)
Se há coisa que esta cidade tem de espectacular são os jardins públicos e parques que salpicam de verde a malha quadriculada. Os Bosques de Palermo são um conjunto de vários espaços que constituem um corredor verde pela cidade. A maioria dos jardins é de acesso livre e gratuito, à excepção do Jardim Japonês, com entrada paga. Alguns jardins têm horário controlado, como o meu favorito, o Rosedal de Palermo.
O Rosedal é um enorme jardim só com rosas, tal como indica o nome. Na Primavera, quando as flores estão a desabrochar, forma-se um festival histérico de luz e cor só comparado com o violeta dos jacarandás. É um espaço lindo, lindo, aonde se acede através de uma ponte estilo jardim romântico inglês, que atravessa o lago que limita o jardim. É um favorito dos porteños em dias de sol – e como poderia ser de outra maneira? É lindo, lindo e grátis, que mais se pode pedir?